Eu
não posso fugir do que é meu. Contento-me, pois, com o que o universo
me dá, essa esperança boba de ser inocente de novo, esse nunca mais
voltar, destruindo muros que nem sequer chegaram a existir, existindo de
mentira, num fechar dos olhos profundamente breu da noite escura, pois
não necessariamente todas as noites são escuras, mas os muros existem
somente no breu, no âmago do pensamento mal arquitetado, na costura mal
feita da minha camisa de dez reais. Eu tenho uma camisa de dez reais. Eu
tenho uma cama desarrumada. Eu tenho um espelho quebrado. Eu tenho um
clichê todo dentro do armário. Tenho também um gato que dorme comigo e
deixa meu cobertor coberto de pelos. O abajur do meu quarto está todo
empoeirado. Coleciono copos e sofro por causa disso, há quatro copos em
cima do criado-mudo, mas não tão mudo quanto eu, que já não sei mais
falar de amor.
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