quinta-feira, 27 de setembro de 2012

Coelho,Paulo. 11 minutos



Era uma vez um pássaro. Adornado com um par de asas perfeitas e plumas reluzentes, coloridas e maravilhosas. Enfim, um animal feito para voar livre e solto do céu, alegrar quem o observasse.
Um dia, uma mulher viu este pássaro e se apaixonou por ele. Ficou olhando o seu vôo com a boca apertada de espanto, o coração batendo mais rápido, os olhos brilhando de emoção. Convidou-o para voar com ela, e os dois viajaram pelo céu em completa harmonia. Ela admirava, venerava, celebrava o pássaro.
Mas então pensou: talvez ele queria conhecer algumas montanhas distantes! E a mulher sentiu medo. Medo de nunca mais sentir aquilo com outro pássaro. E sentiu inveja, inveja da capacidade do voar do pássaro.
E sentiu-se sozinha.
E pensou: “Vou montar uma armadilha. A próxima vez que o pássaro surgir, ele não mais partirá.”
O pássaro, que também estava apaixonada, voltou no dia seguinte, caiu na armadilha, e foi preso na gaiola.
Todos so dias ela olhava o pássaro. Ali estava o objeto de sua paixão, e ela monstrava para suas amigas, que comentavam: “Mas você é uma pessoa que tem tudo.” Entretanto, uma estranha transformação começou a processar-se: como tinha o pássar, e já não precisava conquistá-lo, foi perdendo o interesse. O pássaro, sem poder voar e exprimir o sentido de sua vida, foi definhando, perdendo o brilho, ficou feio— e a mulher já não prestava mais atenção nele, apenas na maneira como o alimentava e como cuidava de sua gaiola.
Um belo dia, o pássaro morreu. Ela ficou profundamente triste, e vivia pensando nele. Mas não se lembrava da gaiola, recordava apenas o dia em que o vira pela primeira vez, voando contente entre as nuvens.
Se ela observasse a si mesma, descobriria que aquilo que a emocionava tanto no pássaro era a sua liberdade, a energia das asas em movimento, não o seu corpo fisico.
Sem o pássaro, sua vida também perdeu o sentido, e a morte veio bater à sua porta. “Por que você veio?”, perguntou à morte.
“Para que você possa voar de novo com ele nos céus”, respondeu a morte. “Se o tivesse deixado partir e voltar sempre, você o amaria e o admiraria ainda mais; entretanto, agora você precisa de mim para poder encontrá-lo de novo.”

segunda-feira, 24 de setembro de 2012




(…) O amor não blinda a tristeza e a vida não nos requinta para o amor. O mundo não nos abraça, apenas roda, entorta, aquece, esfria, mutante que é. O mundo nos engloba como mãe, mas nos acaricia como madrasta de conto de fadas. Enquanto gira, atrela a nossa vida a tantas outras, entrega nossos tesouros e sonhos em mãos invisíveis ainda mais confusas que as nossas. E lá se vão mil teorias!

Das lembranças



Gosto do tempo em que sentamos naquele muro baixinho e deixamos o relógio cheio de ponteiros ser mais amigo do que inimigo. Dividimos as frutas roubadas, completamos músicas que começamos a cantar sem mal intencionar as letras e contamos quantos carros vermelhos passam pela rua. Você quer contar os azuis, mas insisto nos vermelho. Você me olha, baixa a cabeça e murmura: “na tua cor é mais bonito”. Como duas crianças sem precisar de um vídeo-game, como dois adolescente sem precisar de festas ou como dois adultos sem precisar da liberdade… Nós e o nosso muro, as nossas árvores, as nuvens que nos dão licença para ver o sol, os carros que nos dão o prazer da distração: a brincadeira pouca de fingir que o amor é inocência, embora “amor” não se falasse em voz alta Fosse o que fosse, naquela rua daquele bairro, naqueles dias que não sabiam se choviam ou aqueciam, naquelas dúvidas bobas que a gente pensa que são da vida: também é amor fingir que não se é. No parque os balanços voam sozinhos e nas estradas os carros ultrapassam os limites. E a nossa vida desse muro ainda infla os pulmões da rara calma de tocar muito sem querer as mãos enquanto apontamos o céu, a esquina, o passante, o palhaço ou balão. A criança ou o pai. O amante ou o irmão. Apontamos os dedos aos demais para não nos apontarmos, mas somos crianças, temos sonhos em cada ponta do dedo que mira as estrelas durante à noite, você aí e eu aqui, sem muro, somente paredes. E se o meu céu estrelado, de repente se rompe por uma estrela cadente, qual o pedido que eu faço?
(Baixinho, pedirei. Tampe os ouvidos. Não ouça)
– Ô moço que manda no mundo, constrói mais muros para nós dois. E árvores… E carros vermelhos.
Vai, destampe os ouvidos. Eu só pedi a nossa eternidade na calma do furacão.
Será que a conversa fica mais interessante entre jogos de sedução ou nós podemos ir direto ao ponto? Eu te vi quando não deveria. Você me tocou quando não deveria. Os tempos exatos não estão sendo contados mais nesta vida, partiram para outra sem mim. Eu sou suspiros… Você é motivos. Vamos, então, direto ao ponto onde o livro normalmente delongaria detalhes sobre o ambiente, as nossas roupas ou gestos. Vamos ser diretos antes que o ar se vá: erramos tanto a hora que nunca mais saberemos ir embora. Mais suspiros. Quem é que está escrevendo esse maldito livro?

quinta-feira, 13 de setembro de 2012

Come fly with me.


please.I think I'm ready but what about you?

Os pensamentos desistiram de passear e não encontrar um lugar. O peito desistiu da liberdade do pássaro solitário, que desistiu de cantarolar a música sem a própria cena de fundo. Desistiu das paisagens sem o ombro para recostar a cabeça pesada, passada, deixada… Desistiu dos banhos em chafariz sem ter a quem molhar com o chacoalhar das suas asas. Eu sou quem voa. Voava. Você é o ninho, o casulo, o abrigo, a cama quente. É para onde eu sempre quero voltar.





Precisei calar para sentir a necessidade de falar. Precisei falar muito para descobrir que o mundo lá fora considera pouco. Se exagerei nos dois extremos, talvez agora esteja reajustando as ideias, colocando a casa em ordem, mesmo que seja apenas essa aqui onde eu me habito para não me expulsar de todas as outras. Se o descaso me fez menor, nem percebi. Se o silêncio me foi ouro, senti. Nas vezes em que a palavra falada foi o choro, o som do não-sei-mais-o-que-fazer, senti que pouco tem peso no oceano mundano a água que cai pelo olho. Eu me controlo, me encontro e me consolo: o dicionário não me cabe o suficiente. A gente se salva, não se salva? É isso que a vida nos dá a entender quando não sabe se quer de nós a água ou o vinho, a chuva ou o sol, o céu ou o inferno… O silêncio ou a voz. A gente se salva, vou repetindo para não desligar o motor antes da hora, tendo medo todos os dias de adormecer no minuto errado e perder de vez as chances de não sei bem o que – me salvar. Eu travo as batalhas e releio as páginas dos manuais, mas nenhum arranhão ou instrução sabe como se arranca uma estaca sem ouvir o chão ranger. Estacas eu tenho; chão eu sou. “Vai te salvar, vivente”, diria alguém lá da fronteira, fechando os punhos com força no estilo mais grotesco/guerreiro, em cima de um cavalo como foram um dia alguns homens “farrapos” que viveram por lá. Meus punhos estouraram e eu sempre caí de cavalos. Contudo, continuamos trapos, farrapos, guerrilheiros.
Em silêncio todos somos uma grande guerra particular. E fica na boca o gosto de sangue que ninguém vê manchar a roupa.
O peito sabe arder e os olhos sabem gritar.
Precisei lutar para engolir: “a gente se salva”.


sexta-feira, 7 de setembro de 2012




Hoje, lembrei-me da saudade que não manda beijo ou abraço. E lembrei pois era a tua fotografia naquele porta-retrato meio-quebrado-meio-escondido, mas sempre ali. A saudade que não pisa, mas também não acolhe; não promete e nem surpreende. A saudade que… nada. E de tantos “nadas”, de tanto “nadar”, ironicamente falando, morre na praia, ou até mesmo em mim. Hoje, eu lembrei da saudade de falar entre risos um abafado “eu te amo” e de receber daqueles seus dois olhos grandes que me engolem e daquela sua voz que me acostuma mal: “eu também te amo”. Essa tua saudade me para no tempo.


Às vezes me pergunto se existe algo de errado comigo. Talvez eu gaste tempo demais na companhia de meus heróis românticos literários, e consequentemente meus ideais e expectativas são extremamente altos.

In 50 Tons de Cinza