segunda-feira, 21 de abril de 2014


Tocava baixinho aquela música, Michelle, Beatles e ele sorria. Sorria baixinho também. Sorriso pequeno que cabia na mão.
— eu queria ver a cara do Paul agora, eu queria que fôssemos dos anos setenta.
— a cara do Paul?
— é, aquela cara de quem sabe e ri.
ri.
— vinho te deixa tão bonito. - falei.
me olhou.
— micheeeeeeeelle. - cantou.
o beijei.
— vinte segundos pra acabar a música.
— dezenove.
— dezoito.
— dezessete.
— um pedido. - sorriu de novo.
— quinze.
— quatorze.
— você.
— você tem um problema.
— qual é? - se curvou e deitou sobre mim. apoiou o queixo sobre os meus seios.
— tá tocando Michelle e você já tá pensando na próxima música.
— eu sei qual é a próxima.
— Yesterday.
— why she had to go I don’t know, she wouldn’t say. I said something wrong now I long for yesterday.
— mas ainda tá na parte do I love you de Michelle.
— do you? -  me olhou nos olhos.
— acabou.
silêncio.
começou a tocar Yesterday, ele virou o rosto, olhou para vitrola.
— eu gosto dos olhos do Paul. - disse.
segurei seu rosto, beijei sua boca.
— I want you, I want you, I want you. I think you know by now. I will get to you somehow, until I do I’m telling you so you’ll understand. I love you.
riu.
— já tá tocando Yesterday. - disse.
— não importa, Lucas… não importa.

I love you, I love you, I love you. That’s all I want to say, until I find a way I’ll say the only words, I know that you’ll understand.
é pra constar nos autos:
quem vai lidar com o 
o estrago que eu fizer
sou eu
                 tira o olho da minha lágrima
                 não dá glamour pra minha dor
                 não usa minha tragédia pra colorir
                 teu curta desbotado, e sem sabor
não quero carona
nem me olha assim
não sou novela
pra olho que não é cru
                  deixa na minha conta
                  pode deixar que arrumo
                  quem conserta sou eu


                  o estrago que você me deu


"Eu quero você."
Durou dois segundos e meio. Não sei como meus olhos pareceram nesse tempo, provavelmente não-meus. Dois segundos e meio, apenas. Depois me escondi no seu pescoço. Dois segundos e meio, não mais.
"Hum?"

quarta-feira, 5 de março de 2014

Pode se apaixonar pelo que escrevo, não por mim.




Você vai descobrir pessoas melhores e mais bonitas. Vai descobrir que os lugares antigos e até os novos são melhores sem mim. Vai aprender a sonhar como eu, mas não comigo. Vai perceber que dormir no meu colo nem é tão bom assim, porque eu quase nunca durmo. Vai descobrir que o meu humor é, na verdade, só um cansaço da vida. Vai entender que isto que hoje você acha que é inteligência da minha parte, é só curiosidade besta pelo mundo e pelas coisas. Depois, vai descobrir quão inútil é a minha curiosidade. Vai perceber, finalmente, que o meu sorriso é torto e isso não é charme. Vai descobrir que eu até queria ser melhor, mas tenho mais preguiça do que vontade. Vai começar a ver a lista de coisas que deixo para trás por medo de não conseguir. E vai concluir o tamanho da minha imaturidade.

Você vai descobrir que amor é ter a alma nua em frente ao outro, mas não é para mim que vai se despir. Vai descobrir que não superei os traumas de infância e perder a sua a paciência com cada um. Vai descobrir que o meu par de olhos escuros não tem tanta graça assim quanto um daqueles que brilham e a gente vê muito na televisão. Vai descobrir que não é charmoso eu escrever por não saber falar, e, sim, defeito. Você vai descobrir que merece o mundo e eu amo muito aviões, mas não sei nadar e me canso caminhando muito - mas por você eu me afogava, eu machucava os pés. Vai descobrir que eu quero te acompanhar, mas que o seu ritmo, um belo dia, vai cansar de me esperar.

Acredito que você "vai tudo isso e muito mais". Um dia, quem sabe. E todas as noites são difíceis antes que eu acabe pegando no sono, mesmo que você não saiba, mesmo que eu não fale, porque o calendário está contando cada descoberta sua e eu queria parar o tempo... Queria te parar em mim. Eu perco a graça; eu sou quase uma farsa. Mas o meu amor, o meu choro medroso, acuado e perdido, esse é tão verdadeiro quanto a última chuva que eu peguei só para não te deixar sem guarda-chuva.

Mas, se você quiser mesmo me descobrir para sempre, eu posso me reinventar. 


Camila Costa

segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

Há de existir um tempo para eu me recolocar em mim


 (Sei que não, mas prefiro acreditar que sim)

segunda-feira, 3 de fevereiro de 2014

"A vida é assim: a gente escolhe um caminho na esperança de que ele vá nos conduzir a um lugar de alegria. Tolos, pensamos que a alegria está ao final do caminho. E caminhamos distraídos, sem prestar atenção. Afinal de contas, o caminho é só caminho, passagem, não é o ponto de chegada. Com freqüência, a gente não chega lá porque morre antes. Mas há poucos que chegam ao lugar sonhado – só para descobrir que a alegria não mora lá. Caminharam sem compreender que a alegria não se encontra ao final, mas às margens do caminho. Não foi isso que disse Riobaldo? ‘O real não está na saída nem na chegada; ele se dispõe para a gente é no meio da travessia.'"

Rubem Alves
"A vida é assim: a gente escolhe um caminho na esperança de que ele vá nos conduzir a um lugar de alegria. Tolos, pensamos que a alegria está ao final do caminho. E caminhamos distraídos, sem prestar atenção. Afinal de contas, o caminho é só caminho, passagem, não é o ponto de chegada. Com freqüência, a gente não chega lá porque morre antes. Mas há poucos que chegam ao lugar sonhado – só para descobrir que a alegria não mora lá. Caminharam sem compreender que a alegria não se encontra ao final, mas às margens do caminho. Não foi isso que disse Riobaldo? ‘O real não está na saída nem na chegada; ele se dispõe para a gente é no meio da travessia.'" 

Rubem Alves